Às oito da manhã saí com a Daisy para a rua. 
Ele vinha a chegar com o seu Napoleão, de trela curta, com um ar cansado na cara. 
-Bom dia! Bom dia  Napoleão! disse eu quando se aproximaram.

-Já ando com ele bem há uma hora... Ele é que diz por onde quer ir....

O homem tem um ar miserável. Penteou-se esta manhã. Ainda tem água nos cabelos esticados. 

Conheço-lhe a mulher. Foi cozinheira na casa de um doutor, onde serviu mais de vinte anos. De lá ficaram-lhe as falas educadas, alguns preconceitos burgueses, a distância que apresenta com um sorriso. O marido foi ficando cada vez mais longe, mais 'bruto', mais igual aos seus amigos de juventude... Hoje já nem dormem juntos...

Quem diria que foi por este homem que ela se apaixonou quando era nova?!

É preciso compreender a vida para ver estas coisas... 

A beleza do mundo passa também por estas coisas indizíveis....

Notícias ameaçadoras

O mundo continua ameaçador e deprimente...

No entanto hoje o sol brilha aqui em Portugal e faz-nos sentir melhor  mesmo com as notícias das greves que estão programadas para este mês.

Amanhã vou para uma praia mesmo sem tomar banho, mas apanho sol e descontraio de tudo o que me tem afligido nos últimos dias.

A daisy estende-se ao sol no terraço. Para ela é fácil... só tem que se preocupar com a comidinha... 

Que feliz que eu já fui outrora!

O Inverno do nosso descontentamento

O vento sopra incansável e deixa-me inquieta e com uma sensação de desconforto... 

Amanhã, dizem, virá novamente a chuva e o frio. 

Olho as folhas verdes da varanda e vejo-as abanar com inquietação... não sei como conseguem resistir.

Este tem sido o inverno do nosso descontentamento. Nada é fácil. 

O governo tira-me dinheiro da reforma para pagar dívidas contraídas pela má gestão dos banqueiros e já não voltarei a ter o desafogo que tive nos primeiros meses de reformada...  Não vou ter vida para isso.

O meu filho acabou de chegar a Berlim onde passará três dias...  

As saudades matam-me!

Que bom seria poder ter ainda um longo futuro!

O PAPA E A PRIMAVERA

Ah! hoje sim, hoje o dia já me permitiu pensar na Primavera... 

A tarde cai. Vejo-a da varanda, com a porta aberta embora o sol nos tenha deixado há muito. A Daisy senta-se como que à janela, espreita por entre as flores e vai ladrando às pessoas que passam, ao movimento da rua...

O Papa vai pedir a reforma. Gosto deste homem que nos diz com o seu gesto que já não tem forças. É um acto humilde, um acto humano. Ele tem 85 anos e os desvarios do mundo são demais... O resto é sem interesse - a cobiça duns, o sofrimento dos outros, as lutas de classe, a 'limpeza' dos políticos...

E assim a vida passa.

Tarde de sábado

O sábado decorre com uma calma conquistada a custo.

Tenho andado perdida no meio de arrumações e de dores de costas inevitavelmente associadas. À noite leio um pouco na cama e quase sem dar conta adormeço no meio de pesquisas de criminosos de guerra e batalhas ganhas, de um modo ou de outro, contra a Alemanha nazi....  

O que custou vencê-los! 

E agora, devido ao erro de uns poucos, cá estamos nós a ter que aguentar a senhora Merckel, com os seus sonhos realizados à custa de uma Europa unida,custe o que custar...

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O meu filho está em Aveiro, a viver com a Sara na casa dela.

Que saudades que eu tenho da infância dele!

O sonho e a realidade

Eu bem gostaria de acreditar neles! 

Ouço-os falar e parece que todos os problemas estão a ser resolvidos e que a vida continua como deve ser, com os seus altos e baixos e nada de especial se passa... Mas não. As coisas não são assim tão lineares e por todo o lado vemos a tristeza e a infelicidade. Há muita gente a passar fome e com problemas que não se resolvem facilmente. 

Eu sei, eu sei.... vivemos muitos anos numa ilusão de liberdade, num estado de graça que nos fazia voar... 

Cair na realidade é sempre difícil e muitas vezes é mesmo impossível.